NASCECME pergunta e ANVISA responde
Esterilização de pó de talco na CME?
Conheça a resposta de Benefran J. S. Bezerra Especialista em Regulação e Vigilância Sanitária GRECS/GGTES/Anvisa.
“Conforme informações constantes do Jornal Brasileiro de Pneumologia em Artigo de Revisão¹, são realizados procedimentos cirúrgicos onde o talco é um agente esclerosante administrado por via intrapleural, como agente químico promotor de pleurodese. O seu mecanismo de ação é desconhecido, mas o objetivo é desencadear reação inflamatória, de forma a produzir a sínfise fibrosa das pleuras parietal e visceral², reduzindo assim os efeitos decorrentes de derrame pleural. Atualmente as indicações de uso parecem ser associadas a quadros neoplásicos em estágio avançado e como medida paliativa. No entanto, conforme se espera, há a presença de complicações associadas, podendo ocorrer empiemas, expectoração de talco e até granulomas de corpo estranho na cavidade pleural e no pulmão³, além de possíveis riscos de distribuição sistêmica do mineral 4.
Tese de doutorado recente5 não aponta o tipo de talco utilizado, a composição, se de algum silicato específicos ou de outro tipo, mas informa a esterilização do produto em “farmácia hospitalar”, sem informar parâmetros ou métodos específicos.
Segundo Boletim publicado pela OMS em 20076, as formulações de talco para pleurodese devem ser tratadas como “produtos médicos”, já que provocam reação inflamatória no tecido local através de uma resposta metabólica imunológica, após a exposição ao talco. Já a Agência de Regulação de Medicamentos e Produtos para a Saúde da Inglaterra (MHRA)7 considera que estas formulações devem ser tratadas como ‘medicamentos’, apontando que – em 2007 – não haviam produtos “licenciados”, prevendo prescrição destes produtos como medicamentos sem registro, para necessidades clínicas especiais de pacientes sob sua responsabilidade direta.
A Anvisa, por sua vez, adota a seguinte posição: o talco (100% talco), composto de silicato de magnésio em pó está sujeito às RDC/Anvisa nºs 199/06 e 107/16, e pode ser regularizado perante a Anvisa como um medicamentos de notificação simplificada, indicado para uso como agente esclerosante em derrames malignos e no pneumotórax recidivante. O talco faz parte da Denominação Comum Brasileira sob nº 08264 e pode ser identificado sob nº CAS 14807-96-6, cujas especificações devem seguir monografia inscrita na Farmacopeia Brasileira ou em compêndio oficialmente reconhecido pela Anvisa, como a USP, no que diz respeito às suas características físico-químicas e microbiológicas enquanto talco para uso farmacêutico.
Assim, a manipulação deste medicamento deve ser realizada em atenção às Boas Práticas de Manipulação de Medicamentos, em atenção à RDC/Anvisa nº 67/07, sob supervisão e responsabilidade da Farmácia Hospitalar.
Além do mais, nos preocupa a esterilização deste produto em método de calor úmido, já que conforme a Farmacopeia Brasileira, a esterilização de pós deve ser realizada por método de calor seco, especialmente devido à secagem dos mesmos após o processo e a retenção de umidade, especialmente considerando que as estufas são proibidas em CME de hospitais (em conformidade à RDC/Anvisa nº 15/2012).
Dessa forma, a aquisição de talcos para pleurodese deve levar em conta apenas os talcos regularizados na Anvisa como medicamentos de notificação simplificada, que pode ser devidamente verificado por meio de declaração da empresa. Além disso, deve ser preferencialmente adquiridos talcos estéreis para utilização no serviço de saúde, prontos para o uso no procedimento cirúrgico. Entretanto, caso isto não seja possível, o fracionamento deste produto deve ocorrer em atenção às Boas Práticas de Manipulação de Medicamentos, de forma que a esterilização não seja realizada na CME do serviço de saúde. É o entendimento.” – Benefran J.S. Bezerra, Especialista em Regulação e Vigilância Sanitária GRECS/GGTES/Anvisa.
Agradecimento
Agradeço as informações objetivas e fundamentadas do Benefran Bezerra sobre a esterilização de pó de talco na CME e compartilho com vocês.
Leitura de fundamental importância para os profissionais que buscam processos de trabalho seguros aos pacientes. Parabéns Benefran e muito obrigada pela generosidade em compartilhar conhecimento e informação.
Ana Miranda
Currículo Benefran:
Bacharel em Enfermagem pela UNB, Mestrando em Saúde Pública pela Fiocruz/RJ, cursa MBA em Gestão de Centro de Material e Esterilização pelo INESP-SP, Especialista em Vigilância Sanitária pela PUC-GO. Atua como Especialista em Regulação e Vigilância Sanitária na Gerência de Serviços de Saúde da Anvisa.
Referências:
1 – Vaz Marcelo Costa, Marchi Evaldo, Vargas Francisco Suso. Pleurodese: técnica e indicações. J. bras. pneumol. [Internet]. 2006 Aug [cited 2015 Dec 23] ; 32( 4 ): 347-356. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1806-37132006000400014&lng=en. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132006000400014
2- Refosco Tiago J., Dutra Isabela, Schneider Airton. Estudo das alterações ultra-estruturais em pleura de ratos pós pleurodese por talco. Rev. Col. Bras. Cir. [Internet]. 2004 Dec [cited 2015 Dec 23] ; 31( 6 ): 345-348. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-69912004000600002&lng=en. http://dx.doi.org/10.1590/S0100-69912004000600002.
3 – Herman SJ, Olscamp GC, Weisbrod GL. Pulmonary kaolin granulomas. J Can Assoc Radiol 1982; 33:279-80.
4-Werebe EC, Pazetti R, Milanez de Campos JR, Fernandez PP, Capelozzi VL, Jatene FB, Vargas FS. Systemic distribution of talc after intrapleural administration in rats. Chest 1999; 115:190-3.
5- Terra, Ricardo Mingarini. Análise de resultados clínicos e radiológicos de dois métodos de pleurodese com talco em pacientes com derrame pleural maligno recidivante [tese]. São Paulo: , Faculdade de Medicina; 2008 [acesso 2015-12-23]. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/5/5156/tde-25032009-092144/
6- OMS. Quality assurance and Safety:Medicines. Boletim Informativo Sobre Produtos Farmacêuticos nº 05;2007. Disponível em : http://www.who.int/medicines
7- MHRA.Drug Safety Update. Talc for pleurodesis: adverse effects. December 2007; Volume 1 Issue 5: 15.
8 – ANVISA. Denominação Comum Brasileira. Acesso em < http://portal.anvisa.gov.br/documents/33832/2733907/Lista+DCB+Insumos+Farmac%C3%AAuticos+mai2018/45d719a5-f147-4c35-adde-bc4daffe9c89>